quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Tratado de Kioto o unico problema é que o país não é obrigado a assinar

Enfim, o Protocolo de Kyoto! José Goldemberg*

O Brasil é um dos grandes emissores de carbono devido ao desmatamento da Amazônia, o que significa que tem um papel central em qualquer negociação
A
ratificação do Protocolo de Kyoto pela Câmara Baixa da Rússia, por 334 votos a favor e 73 contra, encerra de forma vitoriosa uma luta que já dura sete anos e que muitos de nós já considerávamos perdida.A entrada em vigor do protocolo significa que os países industrializados - com exceção dos EUA - vão reduzir suas emissões de gases que provocam o efeito estufa de modo a reduzi-las em 5% (abaixo do nível de emissões de 1990) até 2012. Para que eles consigam fazer isso são necessárias medidas tomadas em cada um deles, como economizar energia e usar fontes renováveis, substituindo combustíveis fósseis.Com a entrada em vigor do protocolo, começam a funcionar três mecanismos que vão ajudar muitos deles a cumprir as metas de redução acordadas em Kyoto, em 1997. Esses mecanismos são a troca de certificados de emissões e a implantação conjunta de certas ações que só poderão ser usadas pelos países industrializados.O terceiro deles é o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, que vai beneficiar também os países em desenvolvimento. Projetos realizados nesses países -entre os quais o Brasil -, tais como plantar árvores em áreas degradadas (que retiram carbono da atmosfera), poderão dar origem a certificados a serem comprados pelos países industrializados.Estima-se que retirar uma tonelada de carbono da atmosfera valha US$ 10, o que significa que vários bilhões de dólares poderão ser obtidos dessa forma.O Protocolo de Kyoto se deve em boa parte aos negociadores brasileiros que apresentaram proposta de atribuir um valor financeiro ao carbono emitido. Os países industrializados que ultrapassassem suas cotas teriam de pagar uma taxa e os recursos arrecadados (bilhões de dólares) seriam usados para ajudar os países em desenvolvimento a adotarem ‘tecnologias limpas’. A proposta foi substituída pelos mecanismos listados acima, que eram mais atraentes aos proponentes de um ‘mercado de carbono’.Os EUA, que aceitaram a solução, acabaram por não ratificar o acordo. O fato de ele ter conseguido apoio suficiente isola os EUA, que vão ficar fora de um mercado que pode ser dinâmico e lucrativo. Essa deve ser a razão que convenceu os russos a aderirem, assim como a forte pressão exercida pela União Européia.Abre-se agora uma nova fase em que se começa a implementar Kyoto e a discutir sua ampliação. As reduções de emissões previstas não bastarão e para 2025 limitações maiores terão de ser impostas, bem como negociar a participação da China, Índia e Brasil.O Brasil tem muito a lucrar de imediato com o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e esperamos que a pesada burocracia da comissão interministerial que cuida desse assunto seja removida. Caso contrário, China e Índia se apropriarão do mercado.Além disso, o Brasil pode e deve exercer um papel de liderança na discussão do que se deve fazer no futuro, como fez em Kyoto. O Brasil é um dos grandes emissores de carbono devido ao desmatamento da Amazônia, o que significa que tem um papel central em qualquer negociação. Não convém desperdiçar a oportunidade.
* José Goldemberg é Doutor em Física Nuclear, Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, ex-Minístro da Educação, ex-Reitor da USP e prof. aposentado pela USP.
Fonte: Folha de S. Paulo, 23/10/2004

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